No ano de 1991 o bloco do MERCOSUL foi criado através do protocolo estabelecido entre os países Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, inicialmente, para estabelecer uma melhor relação das suas aduanas. Ao ponto em que tal relação comercial foi expandindo houve um impacto econômico constituindo um Mercado Comum embasado no Tratado de Assunção.
Nessa linha, posteriormente, houve a aprovação do ingresso da Venezuela para se juntar ao bloco que seguiu em franco desenvolvimento. Mas, no ano de 2017, especificamente, em 05 de agosto, a República Bolivariana da Venezuela foi suspensa pela efetiva quebra da Ordem Democrática, inviabilizando toda e qualquer negociação recíproca no interior do bloco entre as nações integradas. Nesse sentido segue abaixo a publicação do ato suspensivo:
A República Argentina, a República Federativa do Brasil, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai,
CONSIDERANDO
Que, de acordo com o estabelecido no Protocolo de Ushuaia sobre Compromisso Democrático no Mercosul, subscrito em 24 de julho de 1998, a plena vigência das instituições democráticas é condição essencial para o desenvolvimento do processo de integração;
Que toda ruptura da ordem democrática constitui obstáculo inaceitável para a continuidade do processo de integração;
Que, nas consultas realizadas entre os Chanceleres dos Estados Partes do Mercosul, constatou-se a ruptura da ordem democrática na República Bolivariana da Venezuela, consignada na “Declaração dos Estados Partes do Mercosul sobre a República Bolivariana da Venezuela”, de 1o de abril de 2017, e, desde então, celebraram consultas entre si e solicitaram ao Estado afetado a realização de consultas;
Que as consultas com a República Bolivariana da Venezuela resultaram infrutíferas devido à recusa desse Governo de celebrá-las no marco do Protocolo de Ushuaia;
Que não foram registradas medidas eficazes e oportunas para a restauração da ordem democrática por parte da República Bolivariana da Venezuela;
Que o espírito do Protocolo de Ushuaia sobre Compromisso Democrático no Mercosul é o restabelecimento da institucionalidade democrática no Estado afetado;
Que a aplicação do Protocolo de Ushuaia não deve interferir no funcionamento do Mercosul e de seus órgãos, nem produzir qualquer prejuízo ao povo venezuelano;
Que os Estados Partes do Mercosul se comprometem a trabalhar em favor do restabelecimento da ordem democrática na República Bolivariana da Venezuela e da busca de uma solução negociada e duradoura em prol do bem-estar e do desenvolvimento do povo venezuelano.
DECIDEM:
1) Suspender a República Bolivariana da Venezuela de todos os direitos e obrigações inerentes à sua condição de Estado Parte do Mercosul, em conformidade com o disposto no segundo parágrafo do artigo 5º do Protocolo de Ushuaia.
A suspensão a que se refere o parágrafo anterior terá efeito a partir da data da comunicação da presente Decisão à República Bolivariana da Venezuela, de acordo com o disposto no artigo 6º do Protocolo de Ushuaia.
2) Os Estados Partes definirão medidas com vistas a minimizar os impactos negativos desta suspensão para o povo venezuelano.
3) A suspensão cessará quando, de acordo com o estabelecido no artigo 7º do Protocolo de Ushuaia, se verifique o pleno restabelecimento da ordem democrática na República Bolivariana da Venezuela.
4) Enquanto durar a suspensão, o disposto no inciso III do artigo 40 do Protocolo de Ouro Preto dar-se-á com a incorporação realizada por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, nos termos do inciso II do referido artigo.
São Paulo, 5 de agosto de 2017.
Jorge Marcelo Faurie – República Argentina
Aloysio Nunes Ferreira- República Federativa do Brasil
Eladio Loizaga – República do Paraguai
Rodolfo Nin Novoa – República Oriental do Uruguai.
Dito isso, mesmo entre os altos e baixos e em meio a inúmeras inseguranças com ameaças de saídas de alguns países, bem como a tentativa de outros em negociar por fora do bloco com o Mercado Europeu, o fluxo de relações seguiu em frente. Atualmente, foi aprovada a inserção da Bolívia no bloco. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou no dia 08 de julho ao país para ratificar o seu ingresso aos quadros do MERCOSUL, sendo que, no dia subseqüente já se reuniu com o presidente boliviano Luis Arce para cumprir as formalidades.
Lembrando que, para o ingresso de qualquer país ao bloco MERCOSUL é necessário que o convite seja devidamente formalizado e, posteriormente, encaminhado ao Poder Legislativo da nação convidada no intuito de aprovação pelos seus membros parlamentares. Por fim, após a respectiva inserção aos quadros do bloco, automaticamente, as regras sobre as relações entre esses países da integração regional são absorvidas pela constituição de cada ente confederativo, vide o exemplo do Brasil que segue abaixo:
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
II – prevalência dos direitos humanos;
III – autodeterminação dos povos;
V – igualdade entre os Estados;
VII – solução pacífica dos conflitos;
VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X – concessão de asilo político.
Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações. (Grifos nossos).
Sendo assim, o Brasil recepcionou a formação do MERCOSUL por via do artigo 4º, parágrafo único da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tendo a possibilidade de viabilizar a formação do bloco e negociar em patamar justo a reciprocidade econômica e financeira entre os seus membros.
A América Latina sempre foi instável em suas relações internacionais com os seus membros, pois sofreu e ainda sofre com sucessivos golpes de estado internos, sendo vítimas a Argentina, o Brasil, o Chile, a Venezuela, dentre outros, vide a Bolívia (o próximo país membro do bloco) que sofreu a tentativa de golpe no dia 26 de junho de 2024 liderada pelo General do Exército Juan José Zúñiga.
Em meio a essa instabilidade regional é que dificulta uma relação internacional saudável. Toda e qualquer relação deve ser posta em prática com confiança e respeito e, a partir do momento em que há quebra do regramento democrático não há como funcionar pelas vias recíprocas da democracia sequer alguma negociação, pois deixará de obedecer cada uma das constituições desse regime que recepcionaram o ingresso da nação específica ao bloco violando a lei e a confiança.
Enfim, explicadas a importância da existência do MERCOSUL e o seu mecanismo de funcionamento baseado nas regras democráticas recepcionadas pela constituição de cada ente confederado, vemos hodiernamente, o bloco complexo e com muito espaço a expandir. Quando mencionamos integração, não podemos apenas se basear no suporte econômico e financeiro, –– mesmo sendo este o principal motivo de sua formação — mas, também projetarmos a expansão em várias outras vertentes como uma suposta integração entre os povos de seus membros, como também uma suposta difusão cultural, uma suposta arquitetura de políticas públicas integradas para o desenvolvimento estrutural, dentre várias outras.
Mas, para que tudo isso aconteça o bloco deve possuir comandantes com pensamentos democráticos e sensíveis aos acontecimentos globais. A união entre os membros pode evitar prejuízos e dissabores a cada ente. Pensar em conjunto é melhor do que pensar individualmente, pois todos seriam beneficiados.
Assim, o desenvolvimento regional tem o condão de se basear pelo pensamento de unidade respeitando os deveres e as obrigações recíprocas, as identidades plurais e étnicas, dentre outras, mas sob a visão política, culturais e jurídicas devidamente integradas entre si.
Entretanto, todo e qualquer bloco há queda de braço pelo poder, por isso, necessário especificar mandatos no sentido também da circulação da governança regional. A passagem de bastão gera novos ares, novas características, novas ideias e novas medidas. Mas, isto não pode ser comparado com o protagonismo dentre os países do MERCOSUL, ou seja, o Brasil sempre terá a projeção de liderança por causa dos aspectos econômicos, financeiros, diplomáticos e pelo seu soft power conhecido globalmente em vários espectros como, por exemplo, cultura, esporte, política e outros.
Nunca é tarde, mas já passou da hora do Brasil ser esse protagonista tão almejado pela sua pujança global. A diplomacia brasileira é o fino da bola, sendo respeitada pelas ações do Itamaraty junto aos inúmeros momentos de crises mundiais e mediações equilibradas, infelizmente, com ressalvas ao penúltimo governo que tentou demonstrar que o país tinha condições de radicalizar sem possuir hard power como instrumento de pressão em meio a uma possível realpolitik abarcada pela visão dominante da abordagem realista (às avessas) descrita nos estudos das relações internacionais.
Dr. Edney Firmino Abrantes é Advogado, Cientista Político, Professor e Pesquisador. É Especialista, Mestre e Doutor. É autor do livro “Construção e desconstrução imagética dos políticos nas campanhas eleitorais”, dentre outros. É autor de inúmeros artigos científicos e de opinião em sites e revistas especializadas sejam físicas e ou digitais. É colunista do site Fatos Políticos.
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